Governo estuda proibir ciclistas de pedalarem nas estradas

Proibição de bicicletas em rodovias tem causado polêmica. Sem alternativas seguras, ciclistas enfrentam barreiras legais e práticas. O governo discute o tema no Ciclo Comitê, mas a falta de infraestrutura e critérios claros levanta críticas. Qual será o futuro da mobilidade sustentável no estado?

Imagine pedalar em direção ao litoral e ser impedido de seguir viagem. É exatamente isso que tem acontecido com diversos ciclistas em rodovias paulistas, como a Mogi-Bertioga.

Vídeos recentes mostram a Polícia Rodoviária barrando grupos de ciclistas em blitze específicas, levantando uma polêmica que promete esquentar os debates sobre o uso de bicicletas em rodovias estaduais. No cerne dessa controvérsia está a ausência de regulamentações claras e alternativas seguras para os ciclistas.

A discussão ganhou força após relatos de que o policiamento rodoviário de SP proibiu bicicletas em trechos que levam ao litoral norte, sem oferecer justificativas técnicas ou infraestrutura substitutiva. O tema já está na pauta do CCP – Ciclo Comitê Paulista, fórum que assessora o governo estadual em ações de ciclomobilidade.

O que está acontecendo?
Dois vídeos que viralizaram nas redes sociais no final de 2024 colocaram o assunto em evidência. Em um deles, um PM impede cicloturistas de continuar sua descida pela Mogi-Bertioga.

A ordem foi clara: “De bicicleta não. Podem dar meia-volta. É proibido o tráfego de bicicletas aqui”. Em outro registro, cinco ciclistas que pedalavam em fila indiana foram obrigados a voltar após serem informados sobre a presença de placas proibitivas.

Essa situação acendeu o alerta em diversas comunidades de ciclistas, especialmente porque o CTB – Código de Trânsito Brasileiro não proíbe expressamente a circulação de bicicletas em rodovias.

O artigo 58 do CTB estabelece que as bicicletas devem trafegar nos bordos da pista quando não houver acostamento ou ciclovia — exatamente como os ciclistas estavam fazendo.

Base legal ou abuso de autoridade?
De acordo com Anderson Gianetti, advogado e representante dos ciclistas no CCP, o governo paulista baseia-se no artigo 195 do CTB, que pune a desobediência às ordens de autoridades de trânsito. Gianetti, no entanto, argumenta que não há regulamentação específica que ampare a proibição.

“Bicicleta sequer tem placa ou Renavam para que possa ser multada”, afirma o advogado. Ele classifica a ação como um possível abuso de autoridade, considerando que as regras não foram formalizadas por decreto e não possuem embasamento técnico ou estatístico.

Além disso, Gianetti questiona a lógica da proibição em rodovias como Mogi-Bertioga e Tamoios, comparando-as a rotas turísticas como o Caminho da Fé e a Rota das Frutas. Essas vias, muitas vezes sem acostamento ou ciclovias, não apenas permitem a circulação de ciclistas, mas também são promovidas como destinos turísticos pelo próprio governo estadual.

A confusa aplicação do Código de Trânsito
A Secretaria de Segurança Pública de São Paulo respondeu às críticas alegando que a Rodovia Dom Paulo Rolim Loureiro (SP-098), mais conhecida como Mogi-Bertioga, não se enquadra no artigo 58 do CTB. O órgão citou o artigo 247, que exige que bicicletas trafeguem em fila única, como justificativa para impedir o tráfego.

Contudo, Gianetti rebate: “Esse artigo não proíbe a circulação de bicicletas; ele apenas determina que, na ausência de acostamento ou faixa dedicada, os ciclistas devem trafegar em fila única. É exatamente o que os ciclistas fazem.”

A nota da Secretaria também sugere o uso de “rotas alternativas mais seguras“, sem, entretanto, especificar quais seriam essas rotas. Ciclistas consultados afirmam que tais caminhos simplesmente não existem, reforçando a sensação de desamparo e exclusão.

Por que isso importa?
A decisão de proibir bicicletas em determinadas rodovias expõe uma série de problemas estruturais e políticos. A falta de ciclovias e acostamentos adequados não é novidade, mas as proibições sinalizam uma inversão de prioridades, privilegiando veículos motorizados em detrimento de alternativas sustentáveis e acessíveis.

O caso também levanta questões sobre segurança e mobilidade. Pedalar em rodovias é uma prática comum entre ciclistas amadores e profissionais, tanto para lazer quanto para treinos. A ausência de regulamentação clara e a falta de diálogo entre governo e comunidades de ciclistas dificultam a busca por soluções.

O futuro das bicicletas nas rodovias paulistas
O próximo encontro do CCP, agendado para 14 de fevereiro, promete trazer novos desdobramentos. Enquanto isso, ciclistas, advogados e entusiastas do transporte sustentável aguardam ansiosamente por respostas mais objetivas e por uma postura mais inclusiva do governo estadual.

Se o uso de bicicletas em rodovias for restringido sem a criação de infraestrutura adequada, as implicações podem ser profundas, tanto para a mobilidade quanto para o turismo e o meio ambiente. O que está em jogo não é apenas o direito de pedalar, mas também a promoção de um estilo de vida mais sustentável.

Do Click Petroleo e Gas (Alisson Ficher)
https://clickpetroleoegas.com.br/esqueca-as-bicicletas-na-rodovia-governo-estuda-proibir-ciclistas-de-pedalarem-nas-estradas/