Leis do Império e do início da República sobre vacina previam multa e prisão

No último final de semana, a cidade de São Paulo realizou a “Virada da Vacina” contra o coronavírus. Mais de 99% dos paulistanos adultos e mais de 92% dos paulistas estão vacinados com pelo menos uma dose da vacina, e a previsão também é iniciar a imunização em adolescentes a partir dos 12 anos.

Você sabia que a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo debate e legisla sobre vacinas há mais de um século? Neste texto, vamos ver curiosidades sobre duas leis sobre o tema – uma de 1838, quando a Assembleia tinha apenas quatro anos de funcionamento, e outra do início da República, em 1891.

A primeira previa multa não apenas a quem não se vacinasse, mas também a quem não comparecesse, uma semana depois da vacina, para extrair a secreção formada no local de injeção. Já a segunda lei, dos primórdios da República, chegava a prever prisão para os “antivacina”.

Em 1838, quando o Brasil ainda era Império, foi aprovada pela então Assembleia Legislativa Provincial a Lei 21, de 5 de março. A lei determinava que todas as cidades deveriam nomear agentes para aplicar vacinas e também previa penas aos cidadãos que não comparecessem para ser vacinados.

Além de as pessoas serem obrigadas a se vacinar, também precisavam comparecer novamente, uma semana depois, para extrair a secreção que se formava no local da aplicação, o chamado pus vacínico, com o qual se produziam mais vacinas. Essa técnica foi utilizada no Brasil até 1887.

Tem mais: quem pagasse um perito para aplicar a vacina em casa não era obrigado a realizar a extração do pus vacínico. Na época, a vacina aplicada era contra a varíola, doença que assustava a população. Apesar da obrigatoriedade e da alta taxa de mortalidade da varíola, a tentativa de vacinação atingiu apenas pequena parte da população.

Anos depois, o tema voltou à pauta da Assembleia. Em 1891, logo depois que a Casa reabriu após o advento da República, foi aprovada a Lei 13, que também tratava da obrigatoriedade da vacinação no Estado. A curiosidade a respeito dessa lei é que ela nasceu da participação popular. Um cidadão chamado Theodoro Reichert enviou, no dia 13 de agosto de 1891, uma carta ao Congresso Estadual pedindo que o Legislativo determinasse a obrigatoriedade da vacina. A Comissão de Câmaras Municipais deu parecer favorável à petição e elaborou o projeto de lei.

O projeto passou então para análise da Comissão de Higiene do Senado Estadual (a Alesp, na época, era bicameral). A comissão deu parecer favorável ao projeto, dizendo que a vacinação “é um ponto de higiene e de medicina de incontestável necessidade (…) como preservativo da varíola, portanto, a necessidade de sua obrigatoriedade”.

Considerando a importância do tema, a Comissão de Higiene acrescentou ao projeto um artigo estabelecendo multa e, no caso de falta de pagamento, prisão de um a três dias a quem descumprisse a lei.

Vale registrar os argumentos da petição de Reichert: “Na guerra franco-prussiana, invadiu a França um exército alemão de mais de um milhão de soldados, dos quais nenhum faleceu de varíola, enquanto o exército brasileiro, que invadiu o Paraguai, perdeu milhares de soldados brasileiros de varíola”.

Reichert também mencionou na petição que “Pernambuco, invadido por uma violenta epidemia de varíola, decretou, o ano passado, a lei da vacinação obrigatória e a epidemia desapareceu”.

A famosa Revolta da Vacina ocorreria apenas anos depois, em 1904. Mas essa já é outra história.