MPF entra com ação para cancelar venda ilegal da MTV

Frequência foi transferida por R$ 290 milhões; segundo a Constituição, canais de TV aberta não podem ser comercializados e mudança de concessionário depende de nova licitação.

O Ministério Público Federal em São Paulo entrou com ação civil pública para que o uso do canal de TV aberta antes ocupado pela programação da MTV seja suspenso. A frequência foi vendida pela Abril Radiodifusão S/A em dezembro de 2013, por R$ 290 milhões. O negócio, no entanto, foi ilegal, visto que a comercialização de canais abertos entre particulares é proibida pela Constituição. O MPF já havia requisitado o cancelamento da venda em abril deste ano, quando solicitou toda a documentação referente ao negócio, mas o pedido não foi aceito pela Justiça Federal.

A Abril era proprietária da MTV Brasil e utilizava o canal para transmitir a programação da emissora de música e entretenimento. Após o fim das operações na TV aberta, a companhia vendeu a outorga de radiodifusão que detinha à Spring Televisão S/A. Contudo, como todo serviço público, a concessão de canais de rádio e TV não pode ser transferida ou comercializada. Segundo a Constituição, toda autorização para que a iniciativa privada explore as frequências deve ser feita mediante concorrência pública, de forma a garantir a todos os administrados a possibilidade de disputar as contratações em igualdade de condições. A licitação também permite que o poder público selecione a proposta mais vantajosa, protegendo os recursos e interesses coletivos.

“Mostra-se absolutamente inaceitável que aquele particular que obteve a concessão de um serviço público possa simplesmente negociá-la, pelo preço que entender e para quem escolher, a seu livre desejo, fazendo tabula rasa dos princípios republicano, democrático, da impessoalidade, da moralidade, da eficiência administrativa e da isonomia”, afirmaram os procuradores Elizabeth Kobayashi, Jefferson Dias, Lisiane Braecher, Pedro Machado e Steven Zwicker, autores da ação.

DESVIO DE FINALIDADE. A venda da concessão também representou clara modificação da programação transmitida, visto que, quando da contratação da Abril, foram considerados como requisitos o tempo destinado a programas educativos, culturais, artísticos e jornalísticos. Hoje, a grade do canal é quase integralmente ocupada por conteúdo produzido pela Igreja Mundial do Poder de Deus. “Nas operações de transferência direta e indireta de outorgas de radiodifusão, o particular, negociando livremente no mercado, tende a repassá-la à instituição que lhe pagar o maior valor, independentemente da programação que ela pretenda adotar”, ressalta a ação.

A mudança na programação configura fraude na execução do contrato de concessão, acarretando, entre outras penalidades, suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração por até dois anos, segundo previsto no art. 87 da Lei 8.666/93. A ação do MPF requer ainda que a Abril e a Spring paguem multa de até 20% do seu faturamento bruto, percam os bens, direitos e valores obtidos com o negócio ilegal, bem como tenham suas atividades suspensas, conforme disposto nos arts. 6º e 19º na Lei 12.846/2013.

SEM AUTORIZAÇÃO. Questionada pelo MPF sobre a forma como o negócio havia sido fechado, a Abril alegou acreditar não ser necessária a licitação prévia, bastando para a aprovação do acordo apenas a anuência do Ministério das Comunicações. Isso porque a Lei nº 4.117/62 e o Decreto nº 52.795/63 autorizam a transferência de concessão, desde que com prévia anuência do órgão competente do Poder Executivo. No entanto, apesar da argumentação da empresa, a transação, ocorrida em 2013, foi realizada sem o devido aval do órgão. Segundo a pasta, o pedido da Abril para a transferência da concessão à Spring só foi feito em 2014 e ainda está sob análise. Além disso, para o MPF, ambas as normas da década de 1960 são inconstitucionais, uma vez que a Constituição de 1988 vedou a possibilidade de cessão da outorga sem novo procedimento licitatório.

Além do imediato cancelamento da venda e da suspensão do uso do canal pela Spring, a ação pede que a União anule a concessão do serviço de radiodifusão à Abril e realize nova licitação da frequência. Por fim, os procuradores solicitam que as duas empresas envolvidas no negócio paguem indenização por danos morais coletivos. Leia a íntegra da ação. O número do processo é 0026301-70.2015.4.03.6100. Para consultar a tramitação, acesse http://www.jfsp.jus.br/foruns-federais/

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